terça-feira, 3 de dezembro de 2013

ENTREVISTA


Rabelo quer mudanças radicais na arbitragem


Quando assumiu a direção do Sindicato dos Árbitros de Futebol do Rio de Janeiro (Saperj), em 2004, o ex-árbitro e atual presidente da entidade, Jorge Fernando Rabello (foto), encontrou um clima de terra arrasada. O sindicato não tinha sequer um CEP, seus ativos e documentos desapareceram e a instituição era cliente do SPC e Serasa, bem como havia dividas trabalhistas com fornecedores. Nove anos após, esse mesmo sindicato promove pelo quarto ano consecutivo a festa de confraternização com distribuição de brindes para seus associados (www.saperjarbitros.com.br) - e pela primeira vez desde a sua fundação, irá sortear um carro zero quilômetro nas festividades de final de ano, e, graças ao seu plano estratégico de investimentos, já garantiu um carro zero, nas futuras  confraternizações até  2019.
                         
Rabello enfatiza que desde 2006, quando Rubens Lopes, assumiu a presidência da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ), é praticado o "conceito de sistema" em sua essência e forma, ou seja, FFERJ/SAPERJ/COOPAFERJ/ARBITROS, com todos fazendo parte de um conjunto de partes interagentes e interdependentes, que formam um todo unitário com determinado objetivo e efetuam determinadas funções.
Dada a importância do futebol e da arbitragem da cidade maravilhosa e as informações do modelo de gestão da Federação Carioca de Futebol, do sindicato, da cooperativa e a fortíssima interatividade existente com os membros do quadro de árbitros, que são os únicos do futebol brasileiro a participarem dos lucros obtidos com a exibição das logomarcas nos seus uniformes, questionamos Rabello via e-mail sobre vários temas inerentes à arbitragem, e ele de imediato nos respondeu. Confira a entrevista.
Paranaonline -  Quais são as metodologias que serão aplicadas na pré-temporada aos árbitros que irão atuar no Campeonato Carioca de 2014?
Jorge Rabello – A partir de 6 a 10 de janeiro próximo, pelo quarto ano consecutivo iremos realizar nossa pré-temporada no Centro de Desenvolvimento do Volei, em Saquarema. E, objetivando aproximar-se da uniformização nos critérios de interpretação e aplicação das Regras de Futebol, desenvolveremos com os árbitros e assistentes selecionados, prática no campo de jogo, teoria no campo de jogo, prática na sala de aula e teoria na sala de aula.
Paranaonline – Além da interpretação e aplicação das regras e outros fundamentos de arbitragem, há alguma ferramenta especial que será utilizada na pré-temporada do ano que vem?
Rabello – O presidente da (FFERJ) Rubens Lopes, que tem uma criatividade descomunal e valoriza sobremaneira um dos mais importantes campeonatos do País, após ouvir nossas sugestões, procurou a empresa que vai patrocinar o carioca de 2014, e adquiriu o  Software "REFEREE FEEDBACK", que é utilizado pela Fifa, a Uefa e a Premier League, para treinamento dos árbitros e árbitros assistentes.
Paranaonline - Qual é a importância dessa ferramenta para o quadro de arbitragem que é manejado pelo senhor?
Rabello -  O REFEREE FEEDBACK, tem um conteúdo importantíssimo no estudo das situações de impedimento aos assistentes, no posicionamento em situações dentro e fora da área penal e traz informações relevantes ao árbitro central.
Paranaonline -  Objetivamente, esse Software vai proporcionar avanços nas tomadas de decisões dos homens de preto no campo de Jogo?
Rabello - fundamentalmente o software permite através de sua tecnologia uma auto-aprendizagem comparativa em tempo real, o que é difícil em outras condições, bem como fornecer a equipe de instrutores elementos suficientes para uma análise completa da situação e fornecer ao árbitro e ao assistente diretrizes para melhorar suas decisões.
                                                                              
Paranaonline – Esse equipamento não existe no mercado brasileiro. Qual é a previsão de chegada do software e haverá algum treinamento aos instrutores de arbitragem da Federação Carioca de Futebol?
Rabello – Chegará no dia 17 de Dezembro e junto virá um representante da empresa que nos vendeu,  para ministrar dois dias de treinamentos para nossos instrutores estarem aptos a utilizar o software na pré-temporada de 2014.
Paranaonline – A sua federação está aderindo a tecnologia. Como vê as implementações tecnológicas que a Fifa anunciou recentemente, com o intuito de auxiliar a arbitragem a equacionar lances que fujam do seu campo visual?
Rabello –  Minha opinião sobre o tema é a mesma de Michel Platini, presidente da Uefa. Antes de considerarmos a entrada da tecnologia na arbitragem de forma contínua e desordenada, devemos esgotar todas as possibilidades de aprimoramento e preparação dos recursos humanos, para uma partida de futebol. Além do exposto, temos que levar em consideração que todas as decisões da Fifa e do Board tem consequências em todo o planeta. E, por último, são tecnologias que requerem grande investimento financeiro e se aplicada em todos os Países membros da Fifa, teremos problemas dado o seu alto custo.
Paranaonline – Além da empresa GoalControl, vencedora do processo junto a Fifa na área tecnológica desde o ano passado, que instala quatorze câmeras (sete em cada meta) e da bola com chip -  recentemente o Japão anunciou que está desenvolvendo um estudo com dezesseis câmeras - (sendo oito atrás de cada assistente) – com o objetivo de detectar impedimento em tempo real com precisão milimétrica. Isto não irá  mexer na essência do futebol?
Jorge Rabello – Sou e serei favorável a tecnologia como instrumento de auxílio à arbitragem em lances que escapem do seu campo visual. Agora, conhecendo o conservadorismo dos velhinhos do International Board, podemos afirmar que o que foi aprovado até o momento tem foco em lances objetivos, ou seja, ou a bola ultrapassou ou não a linha de meta na sua plenitude. Qualquer coisa diferente disso tenho certeza não prosperará. As Regras de Futebol tem na sua quase totalidade a interpretação, cujo DNA é a subjetividade.
Paranaonline -  Que avaliação faz  do movimento Bom Senso FC?  E os árbitros, também sofrem desgaste similar aos atletas, ou quanto mais jogos melhor porque recebem por partida?
Rabello – Acho um movimento interessantíssimo, e acima de tudo expõe a ausência de competência e de unidade dos dirigentes dos clubes e das federações de futebol em responder com um calendário objetivo os atletas. Quanto aos árbitros, vejo situação diferente, uma vez que a quantidade de jogos não interfere tanto quanto nos jogadores, em razão do esdrúxulo e obsoleto sorteio, muito embora deva admitir que no campeonato brasileiro deste ano, um grupo seleto de árbitros e assistentes,  devem estar muito cansados, tamanha a quantidade de vezes que foram escalados em algumas oportunidades de forma sequencial.
Paranaonline – Qual é o legado que a Copa do Mundo de futebol deixará à  arbitragem brasileira?
Rabello – Nenhum. Uma vez que o Mundial é apenas um evento. E o problema da nossa arbitragem não está no evento, mas no processo.  
Paranaonline – Os árbitros, Leandro Vuaden e Wilson Seneme foram indicados para o processo pré-seletivo da Fifa pela CBF, para a Copa. Ambos foram reprovados nos testes físicos e sumariamente desligados. Na sua opinião, como está a arbitragem brasileira para o Mundial do ano que vem?
Rabello – Em relação ao Seneme nenhuma novidade. Ótimo árbitro, mas, com um histórico crônico na parte física, problema que vem desde 2007 nos testes físicos (Fifa/Test). Todos tinham conhecimento das suas limitações.  Das duas, uma: ou a política falou mais alto, ou então sua indicação foi por falta de opções. Se foi pela ausência de opções, fica explícito que o processo de renovação realizado no setor do apito, após a Copa da África do Sul pela CA/CBF, fracassou. Já Vuaden, foi uma decepção e nunca poderia ter jogado fora uma oportunidade única.
Paranaonline – E a indicação de Sandro Ricci foi justa?
Rabello – Na verdade o Brasil até o presente instante não sabe qual foi o critério usado nessa indicação. Heber Roberto Lopes, Marcelo de Lima Henrique e Paulo Cesar de Oliveira, estão alguns degraus acima de Ricci, tanto no futebol brasileiro como em âmbito internacional e foram preteridos. Lembro ainda que o histórico de reprovações nos testes físicos da Fifa envolvendo a nossa arbitragem, é antiga e isso faz com que a percepção dos instrutores da entidade internacional nesse quesito, seja a pior possível em relação aos nossos apitos.
Paranaonline – Michel Platini, contrário a tecnologia no auxílio à arbitragem, implementou nas competições da Uefa, os árbitros adicionais (AA) na linha de fundo.  Que análise o sr. faz desse experimento?
Rabello – Lembro que essa experiência colocada em prática pela Uefa, tem um precursor: A Federação Carioca de Futebol. Os árbitros adicionais foram testados pela primeira vez numa partida de futebol, na decisão da semifinal da Taça Rio, em abril de 2008, na partida Botafogo x Fluminense. A Uefa gostou do que viu e em novembro daquele mesmo ano, implementou-a no SUB-19 Europeu, disputado na Eslovênia.
Paranaonline – Posteriormente um dos membros do International Board, Sir. David Macvicar veio ao Rio de Janeiro observar o treinamento da novidade e acabou assistindo ao clássico Botafogo x Flamengo, com os árbitros adicionais.  O que ele disse do que viu?
Rabello - Na oportunidade ele demonstrou satisfação com o nível de treinamento e com a praticidade que observou no campo de jogo. Houve discordância em relação ao lado que deveriam ficar os nominados árbitros. Os nossos adicionais ficavam postados no lado oposto onde atualmente se posicionam os (AA). Perguntei os motivos da discordância e Sir. Macvicar me disse que, colocando o árbitro adicional no mesmo lado do assistente evitaria que o árbitro central abandonasse a sua diagonal.
 Paranaonline – Mas as críticas no futebol brasileiro contra os árbitros adicionais e contra o sr. na época foram contundentes. Há quem diga que eles não servem para nada. É procedente a insatisfação?
Rabello – Acontece que não basta designá-los e postá-los atrás das metas. É necessário treinamento de excelência, como nós fazemos aqui no Rio. Temos vinte e sete federações de futebol, mas apenas Rio e São Paulo utilizam (AA) nos seus campeonatos estaduais. Os demais quando escalados no Brasileirão, apresentam dificuldades de adaptação e em muitas situações ficam perdidos. Na minha opinião é como atravessar o deserto do Saara sem bússola ou mapa, pode até conseguir, mas definitivamente não é a forma mais correta.
Paranaonline - Como ex-árbitro e agora como comandante do grupo de arbitragem da Federação Carioca pergunto: O que vale mais para um bom árbitro: talento, preparação ou personalidade?
Rabello – Penso que o árbitro é um todo. Parte de outro todo que são seus colegas de profissão, possui características psicológicas, talento, personalidade, que terão de ser desenvolvidas enquanto globalidade. É dessa maneira que entendo não haver possibilidade de separar o físico do psicológico, talento da personalidade. Portanto, não há como trabalhar nenhum aspecto de forma separada ou descontextualizada.
Paranaonline – Como presidente do Sindicato dos Árbitros de Futebol do Rio de Janeiro que análise faz da Lei 12.867, que reconheceu a atividade do árbitro como profissional?
Rabello – Em todas as entrevistas que concedi ao ser questionado sobre o fato respondi: Agora a profissão do árbitro é regulamentada. Vai mudar alguma coisa? Não. Se formos perguntar aos sonhadores de 2002, que deram origem ao Projeto de Lei nº 6405/2002, sobre, quais seriam seus objetivos e visão de futuro a respeito da profissionalização dos árbitros, seguramente iríamos ouvir alguma coisa parecida como: “O árbitro de futebol igual a imagem e semelhança do atleta de futebol”, ou seja:- terá seus direitos trabalhistas regidos pela CLT, CONCOMITANTEMENTE a Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé).
Paranaonline - O senhor está dizendo que foram subtraídas propostas do Projeto de Lei 6405/2002, que não foram inseridas na lei que reconheceu o homem de preto como profissional? Traduzindo: O que foi aprovado é um arremedo?
Rabello -  Exatamente. Veja o que faltou no projeto aprovado: O árbitro terá sua remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com as entidades que promovem os eventos (Confederações e Federações). Terá na relação de trabalho todos os requisitos do art.3 da CLT, onde todos os árbitros de futebol são considerados empregados, portanto, observadas as regras da legislação especial (Lei Pelé), seus contratos seriam submetidos a todas as regras da Legislação Geral (CLT).  A pergunta a ser respondida lá trás em 2002, era: o arbitro de futebol pode viver da arbitragem sem outra fonte de remuneração? A resposta era NÃO. Fazemos a mesma pergunta agora em 2013, após a aprovação da regulamentação da profissão e a resposta é a mesma, NÃO. Resumindo: A Lei nº  12.867 produz um efeito similar ao você pisar no acelerador do seu carro e ao mesmo tempo na embreagem, ou seja, temos muito barulho mas o movimento é zero.
Paranaonline – Quais são os motivos que levam a Associação Nacional de Árbitros de Futebol (Anaf), a se manter calada sobre os estratosféricos contratos das publicidade que são estampados nas meias, bermudas, camisas e nas mangas das camisas dos árbitros da (Renaf) e não repassar a esses árbitros um único centavo?
Rabello - Infelizmente a Anaf está sem liderança, acéfala de pessoas, de ideias, projetos e seus congressos realizados anualmente não atendem as demandas da confraria do apito nacional. “Estranhamente” em todos os congressos da entidade é comum observarmos a presença dos “patrões”, e aí prevalece a política. Agora, a verdade precisa ser dita: Não se pode colocar toda a culpa nos ombros a Anaf. Os maiores culpados por tudo que está acontecendo na arbitragem brasileira, são os próprios árbitros, sobretudo, aqueles ostentam o escudo da Fifa, que a tudo veem e nada fazem para mudar o quadro de letargia. Falta coragem, independência aos apitos da Fifa, que por sua “suposta” representatividade poderiam se desejassem, sugerir e provocar transformações significativas na arbitragem nacional em todos os níveis. Mas, o que se vê, é cada um  preocupado em defender seus próprios interesses e com seu bolso. Não existe entidade forte com árbitros fracos.
Paranaonline – O continuísmo é uma forma perversa que atrapalha o desenvolvimento de qualquer segmento. Como evitar a perpetuação de pessoas ou de um grupo como vem acontecendo há mais de uma década no comando da CA/CBF?
Rabello -  Entendo que o modelo de gestão que está em vigor na atualidade necessita de uma mudança urgente, já que de 2007 a 2013, as trocas de comando na CA/CBF não atenderam as necessidades que a arbitragem do Século XXI exige. Recentemente fui informado que o ex-árbitro, Sálvio Spínola Fagundes, deixou a CBF por falta de condições de trabalho. Se de fato aconteceu, ficará uma lacuna, dado o excelente trabalho que Spínola vinha realizando com os apitos pré-selecionados para a Copa do Mundo.  O grande problema do nosso futebol inserido aí a arbitragem, é que os que estão no poder promovem um tipo de cultura insular, ou seja, só conversam entre si, afastam a tudo e a todos e as novas ideias externas ao processo, priorizando de forma especifica suas próprias convicções e interesses.

Um comentário:

  1. Poderia divulgar o curriculum deste senhor que postou suas perguntas e respostas aqui, como, por exemplo, data de nascimento, naturalidade, estado civil, quantos anos de arbitragem, se apitou na Série A e se foi juiz da Fifa? Motivo: gostei muito !

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